Logo chegou o momento de interrogar as duas Manilow. Angela me avisou elas estavam aqui e pedi que entrassem.
- Muito bem, srta. Manilow.
- Rose, por favor.
- Ok. Muito bem, Rose, conte-me tudo que sabe e tudo que viu.
- Eu faço faxina pro pessoal do bairro, sr. Rocket, e achei que alguém tinha me indicado, não sei. Bom, anteontem eu cheguei em casa no fim da tarde e após o banho, já estava cochilando, quando o telefone tocou. Era o John Keats.
- Como era a voz dele?
- Grossa, mas meio fanhosa. Vai ver tava gripado, parecia estar.
- Prossiga, o que ele disse?
- Que queria que eu fizesse faxina no aquário na noite do dia seguinte, e que deixaria a chave e o dinheiro na caixa de correio.
- E você não achou isso estranho?
- Achei sim, sr. Rocket, mas a vida não tá fácil, e não posso negar cliente porque é estranho.
- Claro, claro. Continue.
- À noite vi que a chave estava lá e o pagamento também, e fui à loja, que fica a quatro ruas da minha casa. Quando abri a porta, vi... a... o sr. sabe, a...
- A moça.
- É, é. E saí correndo pra casa, deixei tudo escancarado, e tava chorando alto. Corri pra minha mãe, e ela ligou pra polícia, que pediu que eu voltasse ao aquário. E aí o sr. sabe.
- O sr. Keats não voltou a entrar em contato, não é?
- Não, não. E eu deixei a chave com o policial.
- Bem, eu agradeço a colaboração de vocês. Se precisar, voltarei a ligar. E me procure caso lembre de algo.

Nenhuma novidade.

Eu tinha pedido a dois policiais que já trabalharam comigo que interrogassem as pessoas, cada um na região de um crime, e que me avisassem caso encontrassem algum fato importante, encaminhando a testemunha para a delegacia, onde eu a interrogaria novamente. Então, um dos dois me telefonou:
- Paul!
- Boas notícias, Jones?
- Encontrei um cara que conhece o Dennis Brown que deixou impressões no quarto.
- Sério? Traga-o pra cá agora!
- Talvez o sr. prefira logo investigar a pista quente que ele deu.
- Qual?
- Um possível endereço do suspeito.

Anotei o endereço e já estava me preparando para ir ao local, quando Charles me ligou.
- Paul, relato preliminar da perícia: a outra garota morreu no domingo, não foi? Pois essa está morta desde a noite de sexta!
- Sexta?? Bom Deus!!
- Decididamente o assassino deve ser o mesmo. As mortes são semelhantes. Estava viva quando abriu o abdômen da mesma forma. E tudo indica que a mesma substância a matou, pois já identifiquei degradação do fígado.
- E o Joe?
- Na mesma. Só impressões da própria garota. Ele já está tentando identificá-la, qualquer coisa ligamos.
- Ok, Angela vai falar com você sobre nosso quartel-general. Até mais, Charles.

O assassino não parece cometer erros. Mas vamos ver se o sr. Brown fornece pistas melhores.

Já era quase meio-dia quando saí de carro acompanhado por um policial para ver se encontrava o sr. Brown.
O endereço era num bairro afastado, na periferia da cidade.
O policial estacionou em frente a um pequeno cortiço, com vários aglomerados de casas e quartos alugados. Descemos do carro e batemos numa porta suja. Dela surgiu uma senhora gorda com vassoura em mãos.
- Que é?
- Reside aqui um senhor Dennis T. Brown?
- Sim, mas ele num tá não. Tem uns dia que num aparece.
- Somos da polícia e queremos olhar o quarto dele, algum problema?
- Ele robô neguinho por aí?
- Não, minha senhora, só queremos conversar com ele e vistoriar seu quarto.
- Vô pegá a chave.
A senhora sumiu alguns instantes, nos deixando na porta, e voltou, sem a vassoura e com um molho imenso de chaves na mão.
- Como a senhora se chama?
- Mary. Vamo, é por aqui.
Então ela nos levou a um portão do lado direito da casa, o abriu e nos fez entrar. Era um corredor largo, com um pouco de lodo e musgo no chão, e paredes degradadas pela umidade. No teto tinha algumas vigas curvas de cimento, e ramificações de plantas se enroscando pela parede, demonstrando que aquele lugar talvez um dia já tenha sido belo e agradável.
Ao lado esquerdo tinha uma porta, e eu já estava me dirigindo a ela, mas a senhora Mary seguiu adiante, até um portão baixo de madeira. Empurrou-o bruscamente e nos vimos numa área mal-cuidada, com muito mato, ervas daninhas, e algumas belas flores contrastando com a paisagem. No fundo tinha uma larga porta de madeira, parcialmente bloqueada por uma antena caída.
A senhora Mary enfiou uma chave antiga na porta e a abriu, empurrando com dificuldade.
- Ceis pode olhá a vontade aí, depois me chama na porta preu fechá.
- Obrigado, senhora Mary.
Adentrei na escuridão do recinto, disposto a descobrir que mistérios estavam por trás do sr. Brown.


(inspirado na imagem acima)


Pedi a Angela que solicitasse ao sr. Hughes para alugarmos o prédio dele como sede, e entrei na minha sala para ver os e-mails. Minha eficiente secretária, que sempre madrugava no trabalho, tinha me enviado uma mensagem com a agenda de entrevistas da manhã.
09:00 - William Hughes
10:00 - sra. e srta. Manilow
Eram 8:15, então pedi que Angela me pusesse em contato com o pessoal da perícia. Ela ligou pro celular de Charles e transferiu pra mim.
- Paul.
- Charles, você e Joe foram fazer a perícia no aquário?
- Estamos aqui, acho que em uma hora podemos te dar alguma coisa. Mas tenho notícias a você sobre a outra vítima.
- Você conseguiu obter a causa da morte?
- Sim. Foi difícil, quase não dormi essa noite, mas cheguei a uma conclusão.
- Insuficiência respiratória? Parada cardíaca?
- Antes fosse. Ela foi envenenada. E por uma substância não-identificada. Nenhum dos resíduos encontrados é letal. A pessoa que fez o veneno provavelmente tem avançados conhecimentos químicos, pois obteve algo novo, ou desconhecido. O veneno agiu de forma lenta, então ela já estava envenenada quando ele abriu o abdômen, mas só morreu depois disso, de falência de alguns órgãos vitais, como fígado e rins. Enviei amostras para um amigo mais experiente, veremos se ele esclarece a questão.
- Certo. E Joe identificou a garota?
- Sim, Julia Edwards Grynspan, 15 anos.
- Ok. Assim que tiverem notícias da segunda vítima, me comuniquem.
Pedi que Angela obtivesse a ficha da garota e comunicasse aos pais do ocorrido, além de requisitá-los para depoimento, já na nossa sede de operações.
Após alguns instantes, Angela comunicou que o sr. Hughes estava na delegacia. Eu disse que ele podia entrar.
- Bom dia, sr. Hughes. Sente-se, por favor. Meu nome é Paul Rocket, e sou o responsável pelo caso.
William Hughes tinha 55 anos e possuía alguns imóveis, que alugava de maneira informal para diversas pessoas, por tempos variados.
- Quero que o senhor me conte quem alugou aquele seu imóvel e que contatos teve com a pessoa.
- Foi um homem chamado James Joyce. Ele me telefonou e disse que tinha visto meu imóvel e a placa com meu número e queria alugar por alguns meses. Marcamos de nos encontrar num bar nas proximidades do edifício, ele pegou as chaves e me deixou pago em dinheiro por três meses.
- Como ele era? Quero que me diga tudo que se lembrar a respeito.
- Bem, era um senhor de idade, quase careca. Tinha apenas uns tufos de cabelos brancos na parte de trás. E andava com dificuldade, apoiado em uma bengala. Tinha voz de quem é asmático, e tremia um pouco. Parecia bem fraco e adoentado.
- E o que o senhor pensou dele?
- Sr. Rocket, conversamos muito pouco, não mais que 5 ou 10 minutos. Tive apenas pena de um homem velho como aquele ter que subir toda a escadaria.
Nesse instante, o comunicador tocou.
- Sr. Rocket.
- Estou em depoimento, Angela.
- Eu sei, é que tem uma garota aqui, chama-se Josy Granger, e quer muito falar com o senhor. Está afobada e diz que é urgente.
- Ok, leve o sr. Hughes para o pessoal do retrato falado e mande a garota entrar.
Pedi ao sr. Hughes que falasse com Angela, e agradeci pela colaboração.
A srta. Granger entrou na minha sala soluçando.
- Acalme-se, srta. Granger.
- É que a garota morreu!!! E eu não fiz nada!! Nada!
- Calma! Que garota? Comece do início!
- Então, foi sexta-feira!
- O que foi sexta-feira?
- Eu lavo roupa, sabe, e estava estendendo alguns lençóis que a sra. Baggy tinha deixado pra lavar. E vi a moça entrando no aquário.
- Que moça?
- A moça que foi morta.
- A srta. viu ela entrando no aquário sexta?
- Então, eu tava estendendo os lençóis, e vi. Aquela loja tá desocupada há um tempão, e estranhei quando vi entrando a moça meio oriental, e ela estava acompanhada por um cara que me deu medo.
- Como era ele?
- Estava todo de preto, com as calças dobradas acima dos tornozelos. Parecia bem magro e não era muito alto. Usava um chapéu comum, um guarda-chuvas e estava descalço! Como alguém anda descalço naquele sol quente? Eu comentei com a sra. Baggy e ela disse que tem gente que é acostumada. Eu não sei não, pra mim é coisa de doido.
- Que horas eram?
- Antes do almoço. O almoço na casa da sra. Baggy é servido às 12:15 em ponto. O sr. sabe, ela gosta de tudo na hora.
- E você não viu o cara sair?
- Não, depois do almoço eu fui ajudar a Mimmy a lavar a louça. Na casa da sra. Baggy tem muita louça, aquele batalhão de gente! E eu tinha que esperar os lençóis secarem pra poder passar. Por isso fiquei ajudando a Mimmy, ela é tão fraquinha, nunca dá conta do serviço. E a sra. Baggy paga muito mal a coitada. Mas como eu ia dizendo, eu vi o tipo estranho e não fiz nada!
- Tudo bem, a srta. não tinha como saber. Muito obrigado, srta. Granger. Peça à minha secretária que a encaminhe pro retrato falado.
- Sim, senhor. O senhor é muito bondoso!
Que confusão! Eu tinha agora duas descrições distintas. Seria um grupo de assassinos? Algo não está encaixando bem aqui.


(inspirado na imagem acima, sugerida por Lucas Altamar)


Tranquei a porta do lugar, pedi ao policial Jones que vigiasse o local do crime ou então solicitasse algum patrulheiro noturno, caso seu horário acabasse. Dispensei a srta. Manilow e sua mãe, e requisitei-as para prestar depoimento na delegacia na manhã seguinte.
Já passavam das 21:00 e pedi que o policial me levasse para casa.
Eu estava cansado e faminto, e com saudades da minha querida esposa.

Abri a porta, guardei a minha pasta dentro de uma estante, e ouvi um barulho na cozinha.
- Paul, você chegou!
Ela veio correndo da cozinha, com um avental cobrindo seu vestido vermelho, e me abraçou entusiasticamente, beijando meus lábios.
- Dia cheio?
- Você nem imagina... Temos um assassino serial à solta. Dois cadáveres encontrados num único dia. Temos algumas pistas, mas desconfio que nenhuma delas será muito promissora.
- Hmm, se bem lhe conheço, você não vai conseguir deixar de pensar nisso tão cedo...
- É, acho que você tem razão.
- A não ser que eu te distraia!!
- Hum?
- Vai tomar um banho que o jantar tá saindo!
Tomei uma chuveirada quente, vesti uma roupa confortável e fui à cozinha comer a deliciosa macarronada da minha esposa. A verdade é que não era tão deliciosa assim, mas era uma das únicas coisas que ela sabia cozinhar, e ela fazia com tanto amor que eu achava saborosíssima!
Em seguida fomos para a cama, assistir a uma comédia romântica, abraçados sob o lençol.
Quando o filme terminou, Suzie estava dormindo com a cabeça no meu peito. Desliguei a televisão e minha atenção logo se voltou às perguntas sem-resposta que rondavam meu subconsciente.

E então eu estava sentado em um lugar pedregoso e um tecido cobria minha face. Ventava bastante. Uma pessoa estava sentada atrás de mim e nossas costas se tocavam. Pelo calor emanado, eu sabia que era Suzie. Eu seria capaz de reconhecer seu corpo ao menor contato. Meu primeiro pensamento foi de tirar aquele pano do meu rosto, mas antes de fazê-lo, mudei subitamente de idéia.
- Suzie?
- Paul? O que é isso cobrindo as nossas cabeças?
- Não sei, parece um tipo de tecido. Você quer que eu tire?
- Eu... eu estou com medo. Parece-me que ver vai ser pior.
- Vou tirar da minha cabeça e depois eu digo se é seguro você ver, está bem?
- Certo, amor.
Tirei aquele pano do meu rosto e percebi que estávamos no topo de um monte pedregoso. Para todos os lados que eu olhava, havia um extenso campo verde. Virei-me e vi Suzie sentada, impassível. Puxei o tecido para que ela pudesse ver, mas tinha outro embaixo. Puxei este também, e tinha mais outro. E quanto mais panos eu tirava da face da minha esposa, mais tecidos parecia ter encobrindo-a.
E então me virei nervoso e eu já estava em outro lugar. Vi a garota estripada do dia anterior deitada no chão, e atrás dela, o aquário com a segunda vítima. Mas ao invés de uma mensagem estranha, na primeira tinha escrito "Não olhe" e na segunda "para trás".
Olhei para trás.
Suzie estava deitada atrás de mim, ainda com o tecido cobrindo-lhe a face, mas seu vestido estava rasgado e vi de relance que seu abdômen estava aberto e órgãos saíam de dentro.

Bastou essa visão por uma fração de segundo e despertei assustado. Suzie estava dormindo em cima de mim, e como me sentei de súbito, acordei-a.
- Hmm...Pa-ul? Tá tudo... beeeemm? - sua voz estava mais dormindo que acordada.
- Eu tive um pesadelo, só isso.
- Hmm... - e voltou a pegar no sono.
Beijei sua testa suavemente, vi que ainda eram 4 da manhã e me deitei mais uma vez.

Às 6:15 o som me despertou e, conforme a rotina, tomei meu banho, ajudei o meu anjinho a despertar, fiz nosso café e saímos às 7:30, Suzie dirigindo e me deixando na delegacia.
Mal entrei no lugar e Angela correu na minha direção.
- Sr. Rocket!!
- Diga, Angela.
- O sr. Nolan quer vê-lo imediatamente.
- Certo, estou indo.
Joshua Nolan era meu superior e se queria me ver, provavelmente deveria ser a respeito dos assassinatos.
Bati em sua porta.
- Entre.
Sua sala era repleta de papéis empilhados e muita poeira. Nolan fumava charutos o dia inteiro e o odor era desagradável, além da fumaça que estava sendo expelida nesse exato momento pelo charuto da vez.
- Sente aí, Paul.
- Pois não, sr. Nolan.
- Preste atenção: eu quero esse assassino fora das ruas, entendeu? Preso ou morto, pra mim tanto faz. Mas eu quero sua dedicação integral ao caso. Você tem minha autorização para proceder da forma que desejar. E os homens estão ao seu dispor, escolha alguns para auxiliá-lo. Deixe de dormir, se for preciso, mas resolva-o!
- Sim, senhor.
- Ah! E quero ter um e-mail seu para ler todos os dias quando eu chegar à delegacia, informando o andamento das investigações.
- Perfeito.
- Pode ir, era só isso.
- Senhor!
- Hum?
- Pensei em montar um lugar mais reservado, algo como uma base de operações para a investigação. Tenho permissão para fazer isso?
- Como quiser. Agora suma, tenho o que fazer!
- Tenha um bom dia.


(inspirado na imagem acima, sugerida por Onã)


Se o gato preto podia entrar, alguém podia sair. Corri para o quarto do primeiro andar e encontrei o gato aninhado num canto, com um rato na boca. Não havia luz no ambiente. Olhei ao redor e nada encontrei de interessante. Então tive uma idéia. Subi as escadas novamente e comecei a tatear o chão por toda parte. Pedi uma lanterna fosforescente a Joe e olhei debaixo da cama. Havia um quadrado com menos poeira que o resto. Pus nele minhas mãos e descobri um alçapão para o quarto do primeiro andar. Eu tinha achado a rota de fuga do nosso assassino.

Eram quase 19:00 quando Suzie me telefonou:
- Paul, tou saindo agora, quer que eu te pegue em algum lugar?
- Não, querida. Tou num caso meio complicado, vou demorar mais um pouco. Os rapazes vão me deixar, tudo bem?
- Claro, amor. Cuide-se! Beijo.
- Beijo.

Perguntei a Charles quando ele podia me dar o resultado da causa da morte e ele disse que provavelmente na manhã seguinte. E pedi a Joe para tentar identificar a garota, de forma a podermos avisar a família e investigar seus últimos passos. Descemos todos a escada, a dupla foi embora no furgão da perícia, e eu fui na viatura com o policial. O outro policial ficou aguardando um terceiro chegar para fazer a segurança noturna do local do crime.
O policial estava indo me deixar em casa, após eu decidir que era melhor pensar no dia seguinte, com a cabeça fresca, quando meu telefone tocou.
- Paul Rocket?
- Ele mesmo.
- Policial Jones. Um cadáver foi encontrado e me informaram na delegacia que o senhor deveria ser chamado ao local de crime, pois poderia lhe interessar.
Desta maneira, desisti de ir dormir cedo e pedi ao policial que me levasse ao endereço passado no telefonema.

O endereço era de uma loja de aquários. Quando a viatura parou, pude ver um policial e uma moça abraçada a uma senhora, aparentemente chorando.
- Você é o policial Jones?
- Sim, sr. Rocket.
- O que aconteceu?
- Vou relatar o que a garota me contou, pois ela está muito nervosa. O sr. conversa com ela depois, se achar necessário.
- Ok. Conte o que ela disse.
- Ela é faxineira, e recebeu ontem o telefonema de um tal de John Keats que queria que ela fizesse uma faxina na sua loja de aquários.
- John Keats? ... Ok. Prossiga.
- Então o cara disse que a chave estaria na caixa de correio da casa dela hoje à tarde, junto com o pagamento, em um envelope. Que ela deveria fazer a limpeza no turno da noite, e que deixasse a chave na caixa de correio novamente, após terminar.
- Como a garota se chama mesmo?
- Rose Manilow, e essa é a sua mãe, a sra. Manilow.
- Ok, e o que aconteceu?
- A garota veio fazer a faxina, e quando abriu a porta, se deparou com a cena que o senhor vai ver quando entrar, voltou para casa desesperada e sua mãe telefonou para nós.

Entrei então no lugar, e vi o aquário. Um imenso aquário, talvez cinco metros de comprimento, dois de largura e dois de altura. Estava cheio de água, e na parte de baixo tinha alguma vegetação e pedras. O aquário era fechado na parte superior, de forma que não havia maneira de entrar ou sair algo maior do que duas aberturas circulares de dois centímetros de diâmetro, em extremos diferentes da parte de cima, vedadas por tampas de plástico. Dentro do aquário, o cadáver de uma garota, sendo rodeado por peixinhos ornamentais vermelhos. A garota era branca, e tinha os olhos abertos, novamente com uma expressão serena. Estava despida, à exceção de dois braceletes, e seu ventre estava aberto, com alguns órgãos expostos.
Entendi imediatamente porque eu tinha sido chamado. Além de ambas as vítimas terem sido estripadas, na face direita dessa vítima era possível perceber parte de uma mensagem em sangue, agora coagulado. Uma mensagem que, pelo que pude perceber, era muito semelhante à da testa da primeira vítima.
O assassino já podia ser considerado serial. E sua perspicácia me desafiava. A forma como escondia seus passos. Eu tinha certeza de que impressões não seriam encontradas. E suspeitava que o sr. Brown não teria nada a ver com a história, sendo apenas uma isca.

Telefonei imediatamente para a delegacia. Angela não estaria mais lá, mas eu solicitei assim mesmo que, se possível, entrassem em contato com Charles e Joe, pois eu precisava dos resultados da perícia desse novo crime cedo da manhã.

Dei uma olhada na loja. Não tinha dinheiro em caixa, e tinha alguns aquários pequenos, todos vazios. Numa estante, algumas latas de comida para peixes. Tinha um banheiro, não muito sujo. Todo o lugar estava apenas levemente empoeirado. O grande aquário estava no meio da sala. Atrás da mesa do caixa, encontrei algumas ferramentas, possivelmente utilizadas para construir aquários. O lugar não tinha janelas. Assim como a blusa da primeira vítima, as roupas da garota não foram encontradas em parte alguma.
Este assassino não gostava muito de deixar pistas... Eu estava diante do maior desafio da minha não muito longa vida profissional.


(inspirado na imagem acima, sugerida por Lucas Altamar)


Descartei imediatamente a possibilidade de suicídio, pois a moça estava deitada em forma de cruz e não poderia ter pregado em si mesma os pregos que a mantinham fixa ao chão, nos pulsos e tornozelos. Como se isso não bastasse, seu abdômen estava aberto, e vários de seus órgãos estavam revirados e espalhados por sobre seu corpo despido.
Mas o mais bizarro daquela cena brutal era uma inscrição feita em sangue na testa da garota, em um idioma que eu desconhecia. Parecia antigo, talvez sânscrito. Era o retrato mórbido de um assassinato cruel realizado por uma pessoa de aparente cultura elevada, mas com um notável e perigoso distúrbio psicológico.
Com certeza, não era um dia como os outros. Eu precisava avaliar em detalhes essa cena e descobrir o quanto antes o paradeiro do assassino, pois um calafrio na minha espinha me alertava de que esse poderia ser apenas o primeiro de uma série de crimes complexos e inexplicáveis.

Telefonei para a delegacia e solicitei que a perícia viesse o mais rápido possível. Em seguida, pedi que Angela conseguisse um especialista em idiomas antigos.
Enquanto a perícia não chegava, aproveitei para observar alguns detalhes da cena bizarra em que eu encontrava-me inserido. Cobrindo a cama tinha um lençol bagunçado. Não havia poeira em cima do lençol, o que parecia garantir que alguém tinha usado há pouco tempo. Embaixo da cama só havia poeira, mais algumas baratas e um rato morto. Constatei que os pratos em cima da pia continham restos de pizza e comida chinesa, o que foi confirmado pelas caixas encontradas debaixo da pia. Com certeza haveria impressões digitais. No armário encontrei uma caixa de cereais e um queijo mofado, além de uma faca de cozinha. O banheiro era claustrofóbico e estava imundo. Tinha cabelos no ralo e eram curtos e escuros.
Nenhuma pista realmente interessante. Mas confio na perícia e nas impressões. Telefonei novamente para Angela e pedi para ela verificar quem era o proprietário do imóvel, se estava alugado, etc.
Eram 11:30 quando os peritos chegaram. Um especialista em análises químicas e um médico. Joe e Charles. Mostrei a eles o local todo, pedi para Joe coletar impressões por toda parte. Pedi para analisar os restos de comida, os cabelos do ralo, e também o sangue da inscrição na testa da vítima. E pedi a Charles que identificasse o horário e a causa da morte.
Deixei-os trabalhando, pedi a um policial que ficasse de vigia e fui almoçar com o outro policial, o que foi dirigindo a viatura. Eu tinha visto na vinda uma cantina italiana a apenas duas quadras.
Almocei calmamente, enquanto refletia sobre o crime. Por que a vítima estava com uma expressão calma? Como o assassino tinha saído do quarto? O que significava aquela inscrição?

Após almoçarmos, telefonei novamente para Angela.
- Cadê o especialista em idiomas??
- Há apenas dois na universidade. Um está viajando e falei com esposa do outro, ele não está em casa, ela não sabe aonde foi nem usa celular. Mas pedi que retornasse quando ele aparecesse.
- E o proprietário do edifício?
- Um tal de William Hughes. Está alugado há dois meses no nome de James Joyce.
- James Joyce? Só pode ser falso! Peça ao sr. Hughes para comparecer à delegacia amanhã pela manhã.

Voltei ao local do crime e observei a perícia terminar o seu trabalho. Charles concluiu logo:
- Não pude ainda identificar a causa da morte, Paul. Terei que fazer análises laboratoriais. Mas uma coisa é certa: ela estava viva quando os pregos foram fincados e quando o ventre foi aberto. Quem tiver pregado a garota no chão, usou de muita força, pois os braços foram atravessados pelos pregos em um único movimento. Ao mesmo tempo, usou de delicadeza ao abrir o abdômen dela. Tem conhecimentos anatômicos, pois não feriu nenhum órgão, apenas tirou-os do lugar.
- Posso assumir que usou um bisturi?
- Possivelmente.
- E o horário?
- Essa parte é preocupante. A garota está morta desde 15:50 de ontem.

Joe demorou mais algumas horas, realizando as mais diversas análises. A tarde estava acabando quando ele me chamou para relatar os resultados:
- Cara, tá lotado de impressões por todo canto. A garota deixou impressões no corrimão, num copo, na torneira e em alguns lugares pelo chão. As demais impressões são de um cara chamado Dennis T. Brown. 32 anos, não é fichado. Contudo...
- Vamos, diga logo!
- O sangue na testa não é da garota nem do dono dos cabelos no ralo, que também deixou saliva nos pratos.
- E não tem impressões na testa dela, de quem tenha colocado esse sangue?
- Não.

Saí do edifício. Era noite. Eu tinha mais perguntas que antes. Mas tinha algumas pistas também, e o sr. Brown estava encrencado.
A rua era escura e um poste distante fazia a iluminação. Seria prudente interrogar a vizinhança, para ver se alguém tinha notado algo suspeito.
Avistei um movimento distante e me virei bruscamente. Mas era só um gato. Um gato preto, cuja sombra longilínea tinha me assustado. O gato subiu no muro e dele saltou para a janela do edifício, no primeiro andar, e entrou.


(inspirado na imagem acima, sugerida por Mariana Sathie)


Eram 9:30 quando cheguei ao local. Parecia um dia como os outros, mas assim que abri a porta e pus meus olhos naquela escada, eu soube que este seria diferente. O ambiente cheirava a mofo, talvez devido às infiltrações das paredes. A escada parecia não ter sido lavada na última década. Mas nenhum destes fatores foi o que me alertou para a estranheza que o dia me traria. Esta aviso ficou a cargo da minha intuição.
O dia começara normalmente. Despertei às 6:15 com o som. Não exatamente com uma música tocando. Apenas com o girar da bandeja dos cds para posicionar o cd escolhido no leitor e iniciar a melodia. Mas antes mesmo de tocar, eu já o desligara, para não acordar a Suzie. Suzie é minha esposa. Somos casados há oito meses e namoramos um ano antes do casamento. Ainda houve um período de seis meses no qual fui um apaixonado devoto e precisei conquistá-la passo-a-passo.
Tomei um banho morno, vesti-me para o trabalho e então fui acordar a minha bela adormecida. Suzie tem dificuldades para se levantar e se eu não ajudá-la, é capaz de ficar na cama mais uma ou duas horas e perder o início do expediente. Como todos os dias, a descobri, dei um beijinho em sua testa e ela só resmungou:
- Hmmm?
- Bom dia, amor.
Não houve resposta. Em alguns dias era mais difícil. Apoiei meu braço debaixo de suas pernas e por trás das costas e a ergui. Ela passou os braços no meu pescoço, apoiou a cabeça no meu ombro e permitiu que eu a levasse. Carreguei-a até o banheiro e a coloquei de pé. Sua cabeça ainda baixava, zonza de sono. A despi e a arrastei até debaixo do chuveiro, para só então poder abrir o jato d'água e fazê-la despertar adequadamente.
Enquanto Suzie tomava seu banho, espremi algumas laranjas, assei quatro fatias de pão integral com manteiga e piquei uma banana em cada tigela de iogurte com granola. Então, Suzie apareceu, já vestida e totalmente desperta.
- Bom dia, Paul.
E me deu um selinho.
Tomamos nosso café tranquilamente e saímos de casa às 7:30, no nosso carro. Suzie dirigia e me deixava no trabalho, para só então ir para o dela. Tentamos fazer o contrário algumas vezes, mas meu horário é meio maluco e é melhor que ela fique com o carro para poder voltar na hora que achar mais adequada. Suzie trabalha em uma empresa de software. Eu sou detetive de um distrito policial.
Raramente faço uso de farda ou armas. Ando à paisana e apenas investigo os problemas.
A secretária me recebeu efusivamente:
- Sr. Rocket, sr. Rocket!! Ainda bem que o sr. chegou!!
- Calma, Angela. Fale devagar e diga qual o problema - repliquei, enquanto sentava na minha mesa e ligava o computador para ver as notícias do mundo.
- Um assassinato misterioso. O corpo foi encontrado nessa madrugada. Os policiais o aguardam no local do crime.
- Ok, pode ir.
Abri meus e-mails calmamente, enquanto acessava as notícias em outra aba do navegador. Tinha um boletim do caso me aguardando na caixa de entrada. Um prédio estreito, de três andares, num bairro afastado. Nenhum suspeito. Pensei tratar-se de algo comum.
Após alguns minutos, chamei um policial, que foi comigo na viatura para o lugar. Havia trânsito e levamos algum tempo. Outro policial, que nos aguardava, me relatou mais alguns detalhes e então às 9:30 abri a porta e me deparei com a escada.
Uma senhora de idade, moradora de um apartamento no prédio vizinho, ouviu gritos e deu parte na delegacia. Os policiais arrombaram porta a porta até encontrarem o que parecia o único quarto ocupado do prédio. Encontraram uma garota estripada no lugar. Não havia ninguém além do cadáver e a chave estava na fechadura, que parecia ter sido trancada por dentro. Os policiais não sabiam como proceder, dessa forma isolaram o local e aguardaram a minha chegada.
Subi calmamente as escadas, entrando em cada aposento. Todos estavam vazios, exceto o último, no segundo andar. Era um grande cômodo. No canto direito havia uma cama antiga embaixo da única e pequena janela. Logo ao lado, um armário de madeira roída por cupins, e bem no meio do lugar, uma mesa e duas cadeiras. Na extremidade esquerda, uma pia com pratos e copos sujos e baratas rondando. Havia uma pequena porta, que logo constatei tratar-se de um banheiro imundo.
Por trás da mesa, no chão, estava a vítima. A garota usava um all-star preto, meias um pouco abaixo dos joelhos e uma saia preta e rosa, que terminava onde as meias começavam. Da cintura para cima ela estava despida. Um rápido exame visual não me permitiu encontrar nenhum vestígio do resto de suas vestes. A garota era jovem, talvez 16 ou 17 anos, e tinha cabelos negros e lisos pouco abaixo dos ombros. Seus olhos negros estavam abertos, com uma curiosa expressão calma.


(inspirado nas imagens acima)

A Princesa de Limão

Era uma vez, em uma terra muito muito distante, um ensolarado e colorido lugar chamado Reino de Limão. Era um reino pacífico, governado por um Rei bondoso, e que era muito amado por todos os habitantes, um lugar onde as pessoas eram felizes. O Rei era viúvo, mas tinha uma filha, a Princesa de Limão.
A Princesa de Limão era a mais bela dama de todo o reino, e sua voz era comparável a dos mais afinados pássaros. Os habitantes adoravam vê-la cantar e sempre que havia ocasiões sociais, seu pai pedia que cantasse uma bela canção. A voz da Princesa era tão majestosa que trazia alegria instantânea àqueles que a ouviam.
Mas o Rei de Limão tinha um irmão, e esse irmão tinha o coração corrompido pelo mal, e não aceitava que seu irmão mais novo tivesse herdado o Reino, ao invés dele, que era o primogênito. Quando do nascimento da Princesa, o irmão do Rei, ao visitar o bebê, num momento em que ele estava a sós com a mãe, que estava enferma, lançou-lhe uma maldição! Disse que quando ela completasse 18 anos, seu coração se encheria de tristeza e nunca mais poderia ser feliz. Mas, quando dos aposentos se retirou, a Rainha, que mesmo enferma tinha ouvido tudo, usou seu último sopro de vida para amenizar a maldição, permitindo que a tristeza no coração da Princesa pudesse ser quebrada caso um amor verdadeiro surgisse e a conquistasse.
A Rainha naquele dia faleceu e nunca ninguém soube dessa maldição até que chegou o aniversário de 18 anos da Princesa. O Rei mandou organizar uma grande festa, mas, quando os relógios badalaram meia-noite e a Princesa deveria descer as escadas do salão, agora com 18 anos, e cantar uma de suas belas canções, ela não apareceu.
Preparava-se para entrar no salão e, enquanto ouvia o badalar da hora, sentiu um vazio tomar conta do seu corpo e foi acometida de uma profunda tristeza, que lhe fez perder as forças.
A festa foi cancelada, os habitantes do reino ficaram preocupados com o que poderia ter acontecido à bela Princesa, e o Rei não sabia o que fazer. A Princesa não tinha vontade de fazer nada. Só queria ficar deitada em sua cama. Não sentia vontade de comer, e muito menos de cantar.
Passou-se uma semana e a voz melodiosa da Princesa não tinha sido novamente ouvida. O Rei não conseguia dormir. A angústia com esse problema era imensa. Amava a filha mais do que tudo e seria capaz de qualquer coisa para reaver a felicidade dela, poder ouvir sua voz harmoniosa novamente. Então, seu irmão pediu para lhe visitar e revelou-lhe de sua maldição. E pediu-lhe o Reino de Limão em troca de desfazê-la. O Rei quase aceitou o acordo, mas solicitou uma noite para pensar. A felicidade da Princesa era mais importante que ser Rei. Mas não podia deixar as pessoas do Reino sob o governo de uma pessoa terrível, como o era seu irmão. E assim passou a noite pensando no problema. Até que, em um cochilo, sonhou com sua esposa, a Rainha, e ela lhe revelou a verdade sobre a maldição, e que ele deveria encontrar um verdadeiro amor para a Princesa.
Então o Rei de Limão mandou que pregassem cartazes por todo o Reino à procura de pretendentes. No dia marcado, o Rei mandou que embelezassem sua filha, que a essa altura tinha o rosto pálido e magro e olheiras sem tamanho, tal era sua dificuldade para dormir. Quatro aias do castelo se uniram e com toda a sua habilidade, a fizeram parecer novamente uma Princesa, exceto por um detalhe: a ausência de um sorriso.
O Rei sentou-se em seu trono, com a Princesa ao seu lado, e mandou que fossem entrando, um por um, os pretendentes. E assim começou um longo dia, em que lordes e príncipes, reis e sultões, entraram, um a um, no salão do castelo e fizeram a cortesia à princesa. Alguns tentaram impressionar-lhe com presentes. Outros com belas canções. Ainda alguns com apresentações de humor. Mas a Princesa não esboçou um único sorriso durante todo o dia.
O plano do Rei dera errado e o amor verdadeiro não surgira.
Dia após dia, a Princesa definhava. Parecia destinada a morrer de tristeza.
Quando criança, a Princesa brincara com o filho de sua ama-de-leite. Os dois corriam pelos verdes campos do Reino e aprontavam com todos. Mas então a Princesa teve que estudar com grandes mestres do saber e não teve mais tempo para seu amigo. O garoto, de origem humilde, tornou-se um rapaz e nunca esqueceu a Princesa. Nutria um verdadeiro sentimento por ela. Mas sabia colocar-se em seu lugar. Aparecia apenas nas ocasiões especiais para ver sua antiga amiga de longe, entoando canções com sua majestosa voz.
A Princesa definhava mais e mais, e o médico real, após uma última avaliação, relatara ao Rei que sua filha não passaria do dia seguinte.
Nessa mesma noite, o jovem amigo da Princesa teve um sono irrequieto. E entre vários pesadelos, nos quais sua amada o abandonava e ia para outro mundo, sonhou com uma senhora de verde que se apresentara como a Rainha de Limão. A senhora disse-lhe palavras bonitas, e disse que ele precisava acordar e ir ao castelo salvar a Princesa.
O jovem de apenas 19 anos acordou perto do amanhecer, vestiu-se e correu para o castelo. Lá chegando, não o deixaram vê-la, pois estava muito doente. Mas não era rapaz de desistir fácil. Escalou as paredes da torre do castelo e alcançou a varanda de seu quarto, com a ajuda de uma corda. Não acreditou na cena que viu: a Princesa estava cadavérica, com os olhos fundos e semi-adormecida. Fitou-a intensamente, mas seus olhos estavam fechados. E não parecia que iam abrir novamente. Nesse momento, esbarrou em um jarro, fazendo-o cair e atraindo os guardas do castelo, que logo entraram e tentaram levar embora o plebeu. Mas ele resistiu e, ao se soltar, caiu de joelhos de frente ao leito da Princesa. Aproveitou o ensejo e beijou ternamente seus lábios. Os olhos da Princesa abriram delicadamente, e, enquanto os guardas arrastavam seu amigo para fora, a aia pôde notar uma mudança súbita na aparência da Princesa de Limão. Sua pele ganhou uma tonalidade rosada, as olheiras desapareceram, seus cabelos ganharam nova vida, seus olhos novo brilho. Até mesmo sua compleição parecia mais robusta que há um minuto atrás.
Então a Princesa gritou para que os guardas o deixassem e, olhando em seus olhos, sorriu e, imediatamente, começou a entoar uma canção.
A Princesa e seu amigo de infância vieram a se casar em uma semana. Desse dia em diante, todos os dias ela cantava, na varanda do castelo, para todos que se interessassem por ouvir. O Rei faleceu alguns anos depois, e o casal governou o Reino de Limão com bondade e sabedoria. E viveram felizes para sempre...

FIM


(conto escrito como presente de aniversário para Lady Lemon)

O Valor de Um Byte

Elvis estava trabalhando naturalmente no laboratório, desesperadamente precisando concluir seu mestrado, e distraindo a mente nas conversas de MSN, em um dia que, até então, estava normal, como qualquer outro de sua interminável jornada escrava universitária. É então que seu longínquo amigo Rodolfo lhe questiona:
- Qual o valor de um byte?
Não sabendo responder satisfatoriamente tal indagação, Elvis não mais conseguiu se concentrar nos algoritmos do mestrado e pôs-se a refletir acerca da necessidade filosófica de uma resposta adequada.
Ora, um byte são oito bits. Mas e daí? Também é possível argumentar que um byte pode conter a informação de um caractere Unicode e ainda sobra um bit. Ou pode armazenar um número binário de 7 bits juntamente com o sinal que indica se esse número é positivo ou negativo.
Todavia, essas são respostas científicas para a pergunta. Uma análise mais aprofundada da indagação revela que a semântica da palavra "valor" está associada a um significado mais profundo, de origem filosófica. Por essa razão, a concentração de Elvis nas atividades de seu mestrado foi perdida naquela tarde de quinta-feira.
Então Elvis pôs-se a refletir... Um byte é tão insignificante, não é mesmo? Que falta ele faz? Vivemos em uma era de gigabytes, o que é um mísero byte? Um gigabyte tem 1.073.741.824 bytes! Um bilhão! E hoje temos um sem-número de arquivos com mais de um gigabyte.
Entretanto, apesar da aparente insignificância, um byte pode fazer sim alguma diferença! Um byte faltando e um arquivo pode ter sido corrompido. Oh! E um byte a menos pode impedir uma mensagem de chegar ao seu destino em um desses programinhas de conversação, como o MSN Messenger.
E nesse ponto Elvis chegou a algo realmente interessante. Ele é um exemplo vivo de como um byte pode ter valor inestimável! Um byte conecta as pessoas. Não só um byte, mas se um único estiver faltando, as pessoas podem estar desconectadas umas das outras. Elvis tem a maioria dos seus amigos espalhados em outras cidades. E depende da Internet para ter algum contato com eles. Se um byte resolver atrapalhar, ele perderá a conexão com seus amigos.
E Elvis ainda foi além: se não houvesse o byte, não haveriam os kilobytes, megabytes, gigabytes, terabytes, petabytes, seiláoquebytes, e ele não teria conhecido tantos amigos. Pessoas inestimáveis. Pessoas sem as quais ele não seria o que é hoje. Amigos sim. Amigos virtuais, mas que se tornaram reais, apenas distantes fisicamente. E um byte é o que aproxima Elvis desses amigos. Um byte não pode ser quantificado em unidades materiais, pois seu valor é emocional.
Após essa reflexão, Elvis decidiu formular uma resposta, embora subjetiva. Abriu novamente a janela de MSN com Rodolfo e disse-lhe:
- O valor de um byte é o que fez de mim o que sou hoje. Bytes também são vida, embora não estejam vivos. São o portal para um mundo virtual que pode aquecer o coração das pessoas. Pessoas solitárias, seja por natureza, pelas suas escolhas ou porque o destino assim quis. Essas pessoas podem ter em um byte (na verdade um bom conjunto deles) o conforto de uma palavra de carinho. Eu não saberia viver sem bytes.
Então Elvis optou por subitamente fechar o MSN para não ser imediatamente afetado pela opinião de Rodolfo acerca do que tinha acabado de dizer. Saiu do laboratório e foi dar uma volta pelo campus, refletindo sobre como pequenos bytes tinham lhe feito conhecer pessoas incríveis. Tinham lhe feito ter amigos.


(conto inspirado no título sugerido por Rodolfo Katz)

Chuva em vermelho


Nada na filosofia que tenta reger os fundamentos da Terra e dos céus pode explicar o que acaba de me acontecer.
Ela não tinha razão nenhuma para agir dessa forma.
O que eu fiz de errado? Por que acabar algo que estava indo assim, tão bem?
Saímos para jantar, e então ela diz na minha cara que não dá pra seguir em frente, que acabou. Tentei entender, pedi explicações, mas ela só me deu respostas vagas. Paguei a conta, e deixei-a lá, sozinha.
Só foi o tempo de atravessar a rua e uma chuvona começou a cair.
Parecia que o céu queria me castigar por alguma coisa que eu não sabia ter feito. Talvez fosse pelo mesmo motivo que ela tinha terminado nosso namoro.
Saí andando pelas ruas, debaixo daquela chuvarada. Minha cabeça estava a mil. As coisas não podiam acabar dessa forma.
Mas foi atravessando o semáforo da Rua XV que a vi.
O tempo congelou.
Os carros não andavam. A chuva não mais caía. Os transeuntes mantiveram suas posições, com pernas levantadas em passos iniciados.
Tudo tinha perdido o seu brilho.
Exceto ela.
Uma mulher alta envolta num sobretudo preto elegantíssimo, com sapatos vermelhos, unhas vermelhas, batom vermelho e escondendo-se da chuva sob uma sombrinha vermelha.
Eu não podia ver seus olhos, encobertos pela sombrinha. E todo o mais estava apagado pela escuridão, somente o vermelho vibrante dos seus acessórios destacava-se em meio àquela sombria atmosfera de sábado à noite!
O tempo estava parado. E meus olhos perscrutavam cada centímetro daquela mulher misteriosa. Eu queria saber tudo sobre ela.
Quem era. De onde vinha. Pra onde ia.
Por que mexia comigo dessa maneira.
Queria ver seus olhos. Qual seria a cor dos olhos daquela...
Deusa que tinha saído do seu Olimpo apenas para me buscar.
Anjo que tinha descido dos céus para me ver.
Demônio que tinha subido das profundezas para me seduzir.
O que se esconderia sob aquela sombrinha vermelha?
Como seriam seus cabelos?
O que aquela boca sedutora revelaria?
Por que tinha mãos tão delicadas e tenras?
Seu pescoço nu parecia requisitar por carinho...

E então, enquanto eu estava perdido nos meus pensamentos, a admirá-la, o tempo voltou a passar, e passou todo de uma vez. Um carro buzinava insistentemente para que eu saísse da faixa, pois o semáforo estava aberto para ele, e eu atrapalhava o trânsito.
Corri para a calçada à qual me dirigia quando tudo aconteceu.
Voltei-me para todos os lados, mas não a encontrei.
Olhei uma segunda vez.
E uma terceira.
E ainda uma quarta.
Não havia sinal dela.
O que acontecera?
Teria eu me perdido em pensamentos por tempo suficiente para ela se afastar assim tão rapidamente?
Teria eu imaginado a existência daquela criatura sagrada?
Como pude não perceber o tempo passar?

A chuva continuava grossa, batendo no meu corpo violentamente, auxiliada pelo vento.
Eu estava parado na calçada da Rua XV, quase uma da manhã.
Abri meus braços e senti a chuva a castigar-me.
E subitamente eu senti que precisava ter Anne de volta.
Então pus-me a correr desesperadamente para a casa dela.
Eu amava aquela garota.
A mulher de adornos vermelhos devia ser um anjo. Que desceu dos céus para me fazer enxergar que Anne é a mulher da minha vida e é com ela que eu devo viver o resto dos meus dias.
E sob a chuva eu corri. Numa fria noite de outono. Em busca do meu destino.

Na casa de Anne, abri o portão desesperadamente e bati na porta como um louco. Anne apareceu, de robe, e eu caí de joelhos aos seus pés.
Então olhando para seu rosto, tudo eu compreendi.
Aquela sombrinha vermelha escondia o rosto da minha Anne. Era ela, de sobretudo preto e adornos vermelhos. Aqueles lábios carnudos, o pescoço convidativo e as mãos tenras e jovens. Fora Anne o tempo todo. A minha dama. O mistério que desvendarei dia após dia pelo resto da minha vida.


(inspirado na imagem acima, sugerida por Mariana Sathie)

O Sonho


Hoje eu sonhei com você.
O que mais gosto de fazer é dormir. Porque apenas em meus sonhos eu te vejo. Só quando estou dormindo, você faz parte da minha vida.
No meu sonho, eu sabia que você estava me esperando em algum lugar. Eu sentia dentro de mim que dessa vez daria certo entre nós. Que após dez anos de tentativas mal-sucedidas de um relacionamento, agora as coisas finalmente dariam certo.
Mas eu tinha te prometido chegar até você num determinado momento.
E eu estava em um lugar estranho e não sabia como chegar até você.
Então eu decidi procurar. Os lugares onde eu passava eram esquisitos, coloridos como num clipe dos Beatles em sua fase alucinógena à base de LSD. Tinha pessoas com maquiagens e roupas estranhas. Tinha pessoas de papelão que falavam comigo. E alguns animais conversavam comigo também.
E a todos eu perguntava sobre você. Alguns apontavam direções.
E eu caminhava.
Noite e dia.
Atravessando montanhas, desertos, pântanos, cidades-fantasma, etc. Uma absurda quantidade de lugares estranhos.
E eu caminhava.
E não desistia.
Porque eu sabia que tinha que te encontrar.
Porque eu sabia que meu tempo estava acabando.
E se eu te encontrasse, teríamos nossa chance.
Após atravessar todos esses obstáculos, eu comecei a perder as esperanças.
Senti aquele algo estranho que sentimos nos sonhos.
Aquele sentimento que nos diz que tudo aquilo é um sonho e nada mais.
Eu estava cansado e fraco.
Queria ir pra casa.
Começou a chover forte.
Eu estava em um campo florido.
Com flores de todas as cores e tamanhos.
Me bateu uma sensação triste.
Eu senti que tudo aquilo não passava de um sonho.
E caí de joelhos naquele caminho cortando a colina florida.
Lágrimas rolavam sobre minha face, misturando-se à chuva fria.
Senti vontade de acordar e desistir daquela busca sem resultados.
Mas, quando eu estava sentindo essa dor me arrancando lágrimas, uma sombrinha amarela começou a aparecer, subindo o outro lado da colina. Era uma garota de sombrinha, chapéu e capa amarelos e sapatos vermelhos.
Eu permaneci estático, ensopado pela chuva, enquanto aquela garota se aproximava.
E quando ela chegou perto, pude ver que era você.
Eu tinha te encontrado.
E eu sabia que estava dentro do tempo.
Esbocei um sorriso, e então você me encontrou, e nossos olhos se cruzaram.
Senti vontade de te tocar.
Mas não o fiz.
Porque eu sabia que estava em um sonho.
Estava feliz por ter te encontrado, e isso me bastava.
Apenas sorri e acordei.
E acordei cansado de tanto andar no sonho.
Mas forte por você.
Meu amor por você me mantinha caminhando.

(inspirado na imagem acima e na letra de música abaixo. Conto solicitado por Renata Angeli)



The Sore Feet Song - By Ally Kerr


I walk ten thousand miles,
ten thousand miles, too see you
And every gasp of breath,
I grabbed it just to find you
I climbed up every hill too get to you
I wandered ancient lands too hold just you

and every single step of the way
I pay
Every single night and day
I search for you
through sandstorm and hazy dawn
I reached for you

I stole ten thousand pounds,
ten thousand pounds to see you
I robbed convenience stores
'cause I thought they'd make it easier
I lived of rats and toads and I starved for you
I fought of giant bears and I killed them too

and every single step of the way
I pay
Every single night and day
I search for you
through sandstorm and hazy dawn
I reached for you

I'm tired and I'm weak, but I'm strong for you
I wanna go home but my love gets me through

lalaalalalaalalalalalala
lalaalalalaalalalalaaaaa

la

A Balada das Ilhas Orkney

Autor: Elvis Rodrigues
Inspiração: Standing Stones, Loreena McKennitt (que por sua vez é baseada em uma poesia tradicional irlandesa)
Informação útil: As Ilhas Orkney são um pequeno arquipélago que pertence à Escócia, sendo situadas à nordeste da mesma.


Lembro-me bem de um peculiar acontecimento, muito tempo atrás, que me foi contado quando estive por uns dias conhecendo as Ilhas Orkney. Como grande parte das histórias bonitas, aquelas que lembramos à noite, antes de dormir, aquelas que contamos aos nossos filhos, as que realmente merecem fazer parte da nossa memória, essa história é sobre um romance entre dois belos jovens.
Era uma garota muito bonita, de longos cabelos dourados como o sol, olhos azuis como a imensidão do mar e bochechas rosadas, que lhe conferiam um ar de verídica inocência. Tinha então 18 anos e atraía os olhares e os desejos palpitantes dos corações de muitos jovens rapazes (e outros nem tão jovens assim) da ilha em que vivia, e de algumas das ilhas vizinhas também.
Do outro lado do lago morava um rapaz que a admirava secretamente desde que eram crianças. Era um rapaz direito, ajudava o pai na pescaria. Mas ele não tinha coragem de contar dos seus sentimentos a ela, uma vez que havia muitos outros rapazes interessados, rapazes de melhores condições e mais bem apessoados e que, com certeza atrairiam mais os olhares dela. Ele não tinha esperanças. Mas ainda assim contentava-se em ir vê-la de vez em quando, nas festas. Ir vê-la significava para ele manter distância, mas não desgrudar os olhos daquela bela garota de olhos azuis.
Então, numa dessas ocasiões, na véspera de Natal, os aldeões todos reunidos para dançar ao redor das fogueiras, como manda a tradição, e ele a observá-la, algo diferente acontece. A garota resolve se aproximar dele e iniciar uma conversa. Inicialmente ele ficou tímido, mas ela exalava um perfume doce que o inspirava confiança. E ele resolveu chamá-la para dar um passeio pelas pedras.
Num braço de terra invadindo o mar, havia um círculo de pedras, semelhante àquele encontrado na Inglaterra. Os habitantes acreditavam que aquelas pedras tinham propriedades mágicas, e a disposição circular delas era fundamental para manter essa crença. Muitos rituais eram ali perpetrados, na maior parte das vezes pelos anciões responsáveis, mas algumas vezes por jovens inesperientes em madrugadas sombrias.
Os dois jovens foram então passear ao redor daquelas pedras. Inebriado por aquele doce odor e pela beleza radiante de sua musa, o rapaz segurou a sua mão e proferiu as mais belas declarações de amor. Aquelas que tinha decorado desde o início da adolescência. Também aquelas que tinha composto nas noites de solidão. E ainda outras que surgiram inesperadamente no momento mágico que estava acontecendo. Para sua surpresa, a garota segurou firme a sua mão e também declarou palavras de amor. O casal se abraçou forte.
Conversaram naquela noite sobre os mais variados assuntos, mas sobretudo fizeram planos para o futuro. Se amavam e queriam casar-se. Combinaram dele visitar o pai dela e pedir a sua mão. Antes desse dia, ela contaria tudo à sua mãe, que com certeza a apoiaria. Ia ficando tarde, então foram caminhando de volta à festa. O rapaz queria ir com ela, mas ela disse que seria melhor não chegar acompanhada de um rapaz. Diria ao pai que estivera sozinha. E então, numa ponte solitária, ele puxou-a para perto e beijou seus doces lábios. Abraçaram-se mais uma vez e prometeram se encontrar novamente dali a dois dias. Enquanto a garota se afastava, um pensamento triste percorreu a mente do rapaz, de que poderiam nunca mais se ver. Mas logo ele o varreu da sua cabeça e, quando ela não passava de um vulto, virou-se e dirigiu-se à sua casa, a casa que ele não mais veria.
Veja bem, estou contando essa história da forma que me foi contada, então você deve decidir você mesmo sobre a veracidade destas palavras. Não tenho nada a ver com isso.
O rapaz caminhava alegremente em direção ao seu lar, quando uma sombra se projetou sobre ele, carregando uma adaga reluzente e afiada, que velozmente perfurou seu coração, fazendo seus gritos perturbarem a silenciosa madrugada de Natal.
Do outro lado do lago, a garota estava quase chegando em casa quando uma profunda tristeza se fez sentir em seu coração e ela foi acometida por uma irrefreável vontade de chorar. Ajoelhou-se ao lado de uma árvore e deixou que o pranto escorresse por sobre sua face, sem saber do que se tratava. Então algo lhe impeliu a olhar para trás, e seu amor ali estava, com uma aparência de imperturbável tranquilidade, apontando com seu dedo a luz das estrelas. Seus olhos brilhavam estranhamente e com um sorriso afetuoso, ele se desfez, lentamente abandonando-a. Ela não pôde dizer nada, pois seus olhos não acreditavam no que tinham visto.
Se virou e correu para casa. Jamais comentou dessa história com seus pais. Ela sabia que seu amor estava morto e tinha vindo apenas se despedir. Daquele dia em diante, a donzela seguiu a sua vida numa eterna sombra, sem jamais sorrir novamente, até que chegou o seu dia e ela foi, de braços abertos, a um lugar iluminado encontrá-lo.



Letra da música que inspirou o conto:
STANDING STONES

Words traditional, arranged by Loreena McKennitt
Music by Loreena McKennitt


In one of these lonely Orkney Isles
There dwelled a maiden fair
Her cheeks were red, her eyes were blue
She had yellow, curling hair

Which caught the eye and then the heart
Of one who could never be
A lover of so true a maid
Or fair a form as she

Across the lake in Sandwick
Dwelled a youth she held most true
And ever since her infancy
He had watched those eyes so blue.

The land runs out into the sea
It's a narrow neck of land
Where weird and grim the Standing Stones
In a circle there they stand.

One bonny moonlit Christmas Eve
They met at that sad place
With her heart in glee and the beams of love
Were shining on her face
When her lover came and he grasped her hand
And what loving words they said
They talked of future's happy days
As through the stones they strayed.

They walked toward the lovers' stone
And through it passed their hands
They plighted there a constant troth
Sealed by love's steadfast bands
He kissed his maid and then he watched her
That lonely bridge go o'er
For little, little did he think
He wouldn't see his darling more.

Standing stones of the Orkney Isles
Gazing out to sea
Standing stones of the Orkney Isles
Bring my love to me

He turned his face toward his home
That home he did never see
And you shall have the story
As it was told to me
When a form upon him sprang
With a dagger gleaming bright
It pierced his heart and his dying screams
Disturbed the silent night.

This maid had nearly reached her home
When she was startled by a cry
And she turned to look around her
And her love was standing by
His hand was pointing to the stars
And his eyes glazed at the light
And with a smiling countenance
He vanished from her sight.

She quickly turned and home she ran
Not a word of this was said
For well she knew at seeing his form
That her faithful love was dead
And from that day she pined away
Not a smile seen on her face
And with outstretched arms she went to meet him
In a brighter place.

Standing stones of the Orkney Isles
Gazing out to sea
Standing stones of the Orkney Isles
Bring my love to me
Standing stones of the Orkney Isles
Gazing out to sea
Standing stones of the Orkney Isles
Bring my love to me

Postagens mais recentes Página inicial